Artigo

Informativo STJ 846 Comentado

do PDF AQUI!

1.          Terrenos marginais a rios navegáveis e impossibilidade de indenização por desapropriação

Indexador

Disciplina: Direito istrativo

Capítulo: Bens Públicos

Área

Magistratura

Procuradorias

Destaque

Terrenos marginais a rios navegáveis pertencem à União e não são suscetíveis de desapropriação com indenização, salvo se comprovada enfiteuse ou concessão istrativa de caráter pessoal, sem configurar domínio privado.

REsp 1.976.184-MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 1º/4/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 20, III, da CF/1988 define como bens da União os terrenos marginais a rios navegáveis.

???? O STJ, desde o REsp 508.377/MS, consolidou a impossibilidade de domínio privado sobre tais áreas, salvo em caso de título legítimo de enfiteuse ou concessão istrativa.

???? A interpretação do art. 11 do Código de Águas (Decreto n. 24.643/1934) é restritiva.

???? A indenização é devida apenas por eventual vantagem econômica derivada de relação contratual com o Estado.

???? O mero registro imobiliário não é suficiente para afastar a presunção de domínio público.

Discussão e Tese

???? A controvérsia envolveu pedido de indenização por desapropriação de terreno marginal a rio navegável, no contexto de construção de usina hidrelétrica.

⚖️ Para o STJ:

• Esses terrenos são bens públicos da União e, em regra, insuscetíveis de apropriação privada.

• Apenas situações excepcionais, como enfiteuse ou concessão istrativa formalmente comprovada, item compensação.

• A indenização não decorre de direito real de propriedade, mas de relação contratual istrativa preexistente.

Como será Cobrado em Prova

???? Os terrenos marginais a rios navegáveis podem ser indenizados por desapropriação, desde que o ocupante tenha justo título imobiliário registrado.

❌ Errado. O STJ exige prova de enfiteuse ou concessão istrativa, e o mero registro não comprova domínio privado.

???? A indenização por terrenos marginais só é cabível quando houver prova de concessão istrativa de caráter pessoal, sem reconhecimento de propriedade plena.

✅ Correto. A jurisprudência veda o reconhecimento de domínio privado sobre tais áreas, itindo apenas compensação contratual.

Versão Esquematizada

???? Terrenos Marginais a Rios Navegáveis
???? Art. 20, III, CF – bens da União ???? Inalienáveis e insuscetíveis de domínio privado ???? Código de Águas – interpretação restritiva ???? Indenização apenas por enfiteuse ou concessão ???? Sem propriedade plena: compensação contratual limitada

Inteiro Teor

     A controvérsia reside no debate sobre a existência ou não de direito à indenização de terrenos marginais a rio navegável, discutida em ação de desapropriação para à construção de usina hidrelétrica, em relação aos quais a União sustenta serem bens públicos e insuscetíveis de desapropriação, enquanto a parte requerida alega deter justo título de propriedade, o que garantiria o direito à indenização.

     O Superior Tribunal de Justiça adotava posicionamento que permitia o afastamento da Súmula n. 479/STF quando fosse possível identificar título legítimo pertencente ao domínio particular, presumindo-se os terrenos marginais como de domínio público, mas, excepcionalmente, itindo-se sua integração ao domínio privado quando objeto de concessão legítima por documento público.

     Tal orientação, entretanto, não encontra mais respaldo com a evolução jurisprudencial consolidada no STJ, que, a partir do julgamento do Recurso Especial 508.377/MS pela Segunda Turma, sob relatoria do Ministro João Otávio de Noronha, em 23/1/2007, concluiu que o art. 20, III, da Constituição Federal expressamente extinguira qualquer possibilidade de propriedade privada sobre cursos d’água, terrenos reservados e terrenos marginais.

     Assim, conforme entendimento da Segunda Turma do STJ, a correta interpretação do art. 11, caput, do Decreto n. 24.643/1934 (Código de Águas) ou a se dar de forma restritiva, reconhecendo-se que o único título legítimo capaz de relativizar o domínio público seria aquele decorrente de enfiteuse ou concessão istrativa de caráter pessoal, jamais configurando direito real de propriedade.

     Diante de tal perspectiva, portanto, permite-se apenas a indenização por eventuais vantagens econômicas derivadas da relação contratual estabelecida com o Estado, sem reconhecer propriedade plena sobre tais áreas.

2.         Ilegitimidade do Ministério Público para intervir em litígios tributários comuns entre contribuintes e Fisco

Indexador

Disciplina: Direito Processual Civil / Direito Tributário

Capítulo: Intervenção de Terceiros

Área

Magistratura

Ministério Público

Procuradorias

Destaque

O Ministério Público não tem legitimidade para intervir ou recorrer em ações tributárias individuais entre contribuinte e Fisco quando não demonstrada relevância social nem vulnerabilidade das partes envolvidas.

AgInt no REsp 2.124.453-DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 24/2/2025, DJEN 28/2/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 178, I, do C/2015 prevê a atuação do MP apenas quando houver interesse público ou social relevante.

???? A jurisprudência do STJ distingue entre relevância social objetiva (natureza do bem jurídico) e subjetiva (vulnerabilidade das partes).

???? Litígios tributários individuais não caracterizam, por si só, interesse público que justifique intervenção ministerial.

???? A Fazenda Nacional não é considerada parte hipossuficiente ou vulnerável.

???? Não se demonstrou repercussão coletiva ou multidão de sujeitos afetados (caráter multitudinário).

Discussão e Tese

???? O debate envolveu a possibilidade de o Ministério Público Federal interpor recurso em demanda sobre exclusão de contribuinte do REFIS, alegando relevância social subjetiva e interesse no erário.

⚖️ Para o STJ:

• A legitimidade do MP para intervir exige demonstração concreta de relevância pública.

• A simples natureza tributária da lide e sua eventual replicabilidade não são suficientes para justificar a intervenção.

• A Fazenda possui plena capacidade técnica e jurídica para atuar em defesa do interesse público.

Como será Cobrado em Prova

???? A atuação do MP em litígios tributários entre Fisco e contribuinte depende da existência de relevância social ou vulnerabilidade das partes.

✅ Correto. A jurisprudência restringe a legitimidade do MP a hipóteses justificadas por elementos concretos.

???? O Ministério Público tem legitimidade sempre para intervir como custos legis nas ações que envolvam o Fisco, em razão do interesse do Estado na arrecadação.

❌ Errado. O STJ exige demonstração específica de relevância social ou vulnerabilidade processual, o que não se presume.

Versão Esquematizada

???? Legitimidade do MP em Lides Tributárias
???? Art. 178, I, C – atuação só com interesse público relevante ???? Relevância social objetiva x subjetiva ???? Fazenda não é parte vulnerável ???? Caráter multitudinário deve ser demonstrado ???? MP não atua automaticamente em causas fiscais individuais

Inteiro Teor

     A controvérsia tem origem em relação jurídico-tributário na qual houve o parcelamento do débito tributário no âmbito do Programa de Recuperação Fiscal (REFIS) e que, em razão da expressiva diminuição dos valores de pagamento ao longo dos anos, a Fazenda Pública, istrativamente, excluiu o contribuinte do Programa.

     Em sede judicial, o Tribunal a quo concluiu, à luz do e fático-probatório, que os fatos supostamente geradores da exclusão do contribuinte do REFIS não se subsumem ao art. 5º, VII, da Lei n. 9.964/2000, único fundamento do ato coator impugnado.

     Na qualidade de custos juris, o Ministério Público alega que pode intervir sempre que houver interesse público ou social relevante, nos termos do art. 178, I, do Código de Processo Civil (C/2015).

     Acerca do tema, o Ministro Herman Benjamin, no julgamento do REsp 347.752-SP, abordou a relevância social classificando-a sob a perspectiva objetiva, decorrente dos valores e bens protegidos, e sob a perspectiva subjetiva, em razão da qualidade especial dos sujeitos – como crianças ou idosos – ou da existência de repercussão social de conflitos em massa.

     Possível extrair do referido julgado que, diversamente do que ocorre na defesa de interesses e direitos difusos e coletivos stricto sensu, em que a legitimidade do Ministério Público é automática ou ipso facto -, nos interesses e direitos individuais homogêneos, mesmo que de natureza disponível, a legitimidade ministerial decorre, pois, da presença da relevância social tendo em vista a natureza do bem jurídico tutelado (a dignidade da pessoa humana, a qualidade ambiental, a saúde, a educação) – relevância social objetiva -, ou diante da qualidade especial dos sujeitos de direito ou da repercussão social de conflitos em massa – relevância social subjetiva.

     Na hipótese em análise, o Ministério Público suscita sua legitimidade para interpor recurso sob a perspectiva de relevância social subjetiva ao argumento de que a demanda tem caráter multitudinário, o que enseja sua intervenção em defesa do patrimônio público (“[…] envolver questão com feição multitudinária, vocacionada a repercutir em inúmeras outras relações jurídicas análogas entre contribuintes/fisco, em evidentes reflexos no erário […] o que recomenda a intervenção ministerial no feito na defesa do patrimônio público”).

     Não obstante a isso, o alegado caráter multitudinário do conflito com grave repercussão social não está demonstrado, bem como a Fazenda Nacional não se enquadra como sujeito vulnerável na defesa dos seus interesses, não detendo o Ministério Público Federal legitimidade para interpor recurso, seja para intervir como custos legis, seja para intervir como custos juris ou custos societatis.

3.        Remessa necessária e ausência de preclusão na análise de matéria não suscitada em apelação

Indexador

Disciplina: Direito Processual Civil

Capítulo: Recursos e Reexame Necessário

Área

Magistratura

Procuradorias

Destaque

A remessa necessária possui ampla devolutividade, permitindo ao tribunal reexaminar integralmente a condenação imposta à Fazenda Pública, mesmo nos pontos não suscitados em recurso voluntário.

AgInt no REsp 1.935.370-TO, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 24/2/2025, DJEN 27/2/2025.

Conteúdo-Base

???? A remessa necessária está prevista no art. 496 do C/2015 (e anteriormente no art. 475 do C/1973).

???? A Súmula 325/STJ assegura que “a remessa oficial devolve ao tribunal o conhecimento de toda a matéria impugnada na sentença”.

???? Não se aplica à remessa necessária o limite do tantum devolutum quantum appellatum.

???? A interposição de apelação voluntária pela Fazenda não impede o conhecimento integral da matéria pelo tribunal.

???? O STJ entende que não há preclusão para as matérias alcançadas pela remessa oficial.

Discussão e Tese

???? A controvérsia tratou da possibilidade de análise de pontos não recorridos voluntariamente pela Fazenda, mas abarcados pela remessa necessária.

⚖️ Para o STJ:

• A remessa oficial tem natureza de condição objetiva de eficácia da sentença.

• O tribunal pode analisar todas as parcelas da condenação, independentemente do conteúdo do recurso voluntário.

• A devolutividade é plena, impedindo a preclusão da matéria.

Como será Cobrado em Prova

???? A remessa necessária permite ao tribunal reexaminar integralmente a condenação imposta à Fazenda Pública, inclusive em pontos não recorridos.

✅ Correto. A jurisprudência afirma que não há preclusão sobre matérias abrangidas pela remessa oficial.

Versão Esquematizada

???? Remessa Necessária e Devolutividade
???? Art. 496 do C – reexame obrigatório ???? Súmula 325/STJ – devolutividade ampla ???? Não se aplica o tantum devolutum quantum appellatum ???? Apelação não limita o reexame ???? Matérias não recorridas também podem ser analisadas

Inteiro Teor

     Controverte-se a respeito do cabimento do reexame necessário em caso de interposição voluntária do recurso de apelação.

     Acerca do tema, o Tribunal de origem decidiu, em suma, que, tendo em vista a finalidade da remessa necessária, é perfeitamente possível a análise da remessa necessária mesmo havendo a interposição de recurso voluntário.

     A propósito, esse entendimento está em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

     À luz do disposto no art. 475 do C/1973, o STJ firmou orientação no sentido de que a remessa oficial devolve ao Tribunal o reexame de todas as parcelas da condenação adas pela Fazenda Pública (Súmula 325 do STJ), não se limitando ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum (AgInt no REsp 2.068.436-AL, rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 11/3/2024, DJe de 14/3/2024; e AgInt no AREsp 285.333-GO, rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 25/6/2019, DJe de 9/8/2019).

     Dessa forma, a remessa necessária possui ampla devolutividade, de maneira que as condenações da Fazenda Pública poderão ser objeto de análise pelo Tribunal independentemente da interposição de apelação, pois não ocorre preclusão da matéria não suscitada naquele recurso.

4.        Penhora em execução fiscal contra empresa em recuperação judicial

Indexador

Disciplina: Direito Tributário / Direito Empresarial

Capítulo: Execução Fiscal / Recuperação Judicial

Área

Magistratura

Procuradorias

Destaque

Não cabe ao juízo da execução fiscal condicionar a penhora à demonstração, pela Fazenda Pública, de que a constrição não compromete o soerguimento da empresa em recuperação judicial, tampouco avaliar a essencialidade do bem.

REsp 2.184.895-PE, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 1º/4/2025, DJEN 4/4/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 6º, § 7-B, da Lei 11.101/2005, com redação dada pela Lei 14.112/2020, regula a competência entre o juízo da recuperação judicial e o da execução fiscal.

???? A jurisprudência do STJ reconhece que a execução fiscal prossegue normalmente, mesmo após o deferimento da recuperação judicial.

???? O juízo da execução fiscal é competente para determinar a penhora, independentemente de impacto sobre o plano de soerguimento.

???? Cabe ao juízo da recuperação apenas substituir penhora sobre bem de capital essencial, mediante cooperação recíproca.

???? A Fazenda não precisa provar previamente que o bem não é essencial.

Discussão e Tese

???? A controvérsia girou em torno da possibilidade de o juízo da execução fiscal exigir da Fazenda demonstração de que a penhora não afetaria o plano de recuperação da empresa.

⚖️ Para o STJ:

• O juízo da execução é soberano para determinar atos de constrição.

• A análise da essencialidade do bem é posterior e cabe ao juízo da recuperação.

• A exigência de prova prévia da não essencialidade tornaria inviável a efetividade da cobrança fiscal.

Como será Cobrado em Prova

???? A Fazenda Pública deve comprovar, previamente, que a penhora de bens não comprometerá o soerguimento da empresa em recuperação judicial.

❌ Errado. O STJ afirma que essa avaliação cabe, a posteriori, ao juízo da recuperação, e não condiciona o deferimento da penhora.

???? A penhora em execução fiscal contra empresa em recuperação judicial pode ser deferida desde que demonstrado que o bem não é essencial à sua atividade.

❌ Errado. A jurisprudência do STJ confere ao juízo fiscal a prerrogativa de determinar a constrição, cabendo à recuperação, se necessário, a substituição do bem.

Versão Esquematizada

???? Penhora em Recuperação Judicial
???? Lei 11.101/2005, art. 6º, § 7-B (Lei 14.112/2020) ???? Execução fiscal não se suspende ???? Juízo da execução pode penhorar bens ???? Juízo da recuperação substitui bem essencial ???? Fazenda não precisa comprovar ausência de prejuízo prévio

Inteiro Teor

     Na origem, a Fazenda Nacional teve negado o pedido de penhora de bens de empresa em recuperação judicial. O fundamento para a negativa foi o de que a Fazenda não demonstrara que a penhora não comprometeria o plano de recuperação.

     Isso posto, a controvérsia centra-se em saber se, no bojo de execução fiscal, é dado ao Juízo condicionar o deferimento de penhora à comprovação, pela Fazenda, de que a constrição judicial almejada não compromete o soerguimento da empresa executada que se encontra em recuperação judicial ou mensurar, a esse propósito, a relevância do bem para a manutenção das atividades da recuperanda.

     O dissenso jurisprudencial então existente entre a Segunda Seção e as Turmas integrantes da Seção de Direito Público do Superior Tribunal de Justiça veio a se dissipar por ocasião da edição da Lei n. 14.112/2020, que, a seu modo, delimitou a competência do Juízo em que se processa a execução fiscal (a qual não se suspende pelo deferimento da recuperação judicial) para determinar os atos de constrição judicial sobre os bens da recuperanda; e firmou a competência do Juízo da recuperação judicial “para determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial”.

     Com efeito, o advento da Lei n. 14.112/2020 demonstrou não mais haver espaço – diante de seus termos resolutivos – para a interpretação que confere ao Juízo da recuperação judicial o status de competente universal para deliberar sobre toda e qualquer constrição judicial efetivada no âmbito das execuções fiscal e de crédito extraconcursal, a pretexto de sua essencialidade ao desenvolvimento de sua atividade.

     De fato, o § 7-B do art. 6º da Lei n. 11.101/2005 (incluído pela Lei n. 14.112/2020) ou a delimitar a atuação do Juízo recuperacional, conferindo-lhe a possibilidade, apenas, de determinar a substituição do bem constrito por outra garantia, sem prejuízo, naturalmente, da formulação de proposta alternativa de satisfação do crédito, em procedimento de cooperação recíproca com o Juízo da execução fiscal e em atenção ao princípio da menor onerosidade.

     Assim, em se tratando de execução fiscal, o Juízo da recuperação judicial ostenta competência para determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam não sobre todo e qualquer bem, mas tão somente sobre “bens de capital” essenciais à manutenção da atividade empresarial, até o encerramento da recuperação judicial.

     Desse modo, incumbe ao Juízo da execução fiscal proceder à constrição judicial dos bens da executada, sem nenhum condicionamento ou mensuração sobre eventual impacto desta no soerguimento da empresa executada que se encontra em recuperação judicial, na medida em que tal atribuição não lhe compete.

     Em momento posterior (e enquanto não encerrada a recuperação judicial), cabe ao Juízo da recuperação judicial, na específica hipótese de a constrição judicial recair sobre “bem de capital” essencial à manutenção da atividade empresarial, determinar sua substituição por outra garantia do Juízo, sem prejuízo, naturalmente, de formular, em qualquer caso, proposta alternativa de satisfação do crédito, em procedimento de cooperação recíproca com Juízo da execução fiscal, o qual, por sua vez, deve observar, sempre, o princípio da menor onerosidade ao devedor.

5.        Erro médico e responsabilidade objetiva do hospital: vedação à denunciação da lide

Indexador

Disciplina: Direito do Consumidor / Direito Processual Civil

Capítulo: Responsabilidade Civil e Intervenção de Terceiros

Área

Magistratura

Defensoria Pública

Destaque

Em caso de erro médico, o hospital não pode denunciar a lide aos profissionais de saúde, por incidir a responsabilidade objetiva nas relações de consumo, vedada a formação de litisconsórcio regressivo no mesmo processo.

REsp 2.160.516-CE, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, por maioria, julgado em 1º/4/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 88 do CDC veda a denunciação da lide entre fornecedores nas relações de consumo.

???? A responsabilidade do hospital é objetiva, fundada na teoria do risco da atividade (arts. 12 e 14 do CDC).

???? O hospital responde independentemente de culpa dos médicos.

???? A existência de erro individual não afasta a falha na prestação do serviço como um todo.

???? A responsabilização solidária impede a discussão regressiva no mesmo processo.

Discussão e Tese

???? A controvérsia envolveu a tentativa de um hospital de chamar os médicos ao processo por erro no atendimento a paciente.

⚖️ Para o STJ:

• A denunciação da lide é incabível em razão da solidariedade na responsabilidade do fornecedor.

• A apuração istrativa interna de erro médico confirma a falha institucional.

• O detalhamento da conduta de cada médico não descaracteriza a natureza objetiva da relação de consumo.

Como será Cobrado em Prova

???? O hospital pode denunciar a lide aos médicos quando identificar erro técnico individual, a fim de garantir eventual direito regressivo.

❌ Errado. O CDC veda a denunciação entre fornecedores em litígios com consumidores.

???? A responsabilidade do hospital é objetiva e independe da prova de culpa dos médicos, bastando a demonstração de falha no atendimento.

✅ Correto. A teoria do risco da atividade fundamenta a responsabilização direta da instituição hospitalar.

Versão Esquematizada

???? Erro Médico e Responsabilidade Hospitalar
???? Arts. 12, 14 e 88 do CDC ???? Responsabilidade objetiva do hospital ???? Vedação à denunciação da lide ???? Solidariedade entre fornecedores ???? Teoria do risco da atividade na saúde

Inteiro Teor

          Cinge-se a controvérsia em decidir sobre a denunciação da lide, requerida pelo hospital, aos médicos responsáveis pelos atendimentos a paciente, aos quais é imputada a prática de erro médico.

     Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não é possível ao hospital denunciar a lide aos médicos responsáveis pelo atendimento da paciente, em razão da incidência dos arts. 12, 14 e 88 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

     No caso em apreço, a parte buscou atendimento no hospital em quatro dias distintos. Em cada uma dessas ocasiões, foi atendida por um médico diferente que estava de plantão.

     Além de ter sido obrigada a procurar a opinião de um quinto médico, desta vez particular, teve que arcar com os custos dos exames. Ainda assim, só conseguiu a internação após insistência perante a direção do hospital.

     Nesse contexto, o fato de a exordial trazer o nome dos médicos que atenderam a então paciente não desnatura a natureza objetiva da responsabilidade civil na relação de consumo.

     A minúcia na narração dos fatos serve justamente para demonstrar que, independentemente do profissional específico que o hospital escolheu para prestar o serviço, houve falha nos protocolos de atendimento. Portanto, houve falha na prestação do serviço, atraindo a aplicação da teoria do risco da atividade.

     Ademais, a ouvidoria do hospital enviou e-mail à paciente e informou que foram constatados erros praticados tanto pelo corpo médico quanto pelo corpo de enfermagem, de modo que os respectivos profissionais, segundo relatado, teriam sido advertidos e punidos.

     Logo, se houve apuração istrativa que constatou falhas e se há hierarquia que possibilita a orientação, advertência e punição, não há como afastar a responsabilidade e, por consequência, como ser desnecessária a denunciação da lide.

     Em resumo, a teoria do risco da atividade, que norteia a responsabilização civil consumerista e processualmente veda a denunciação da lide, tem por objetivo justamente evitar que questões complexas sejam discutidas de forma excessivamente prolongada.

6.        Honorários recursais e terceiro que ingressa na fase recursal com recurso não conhecido

Indexador

Disciplina: Direito Processual Civil

Capítulo: Honorários de Sucumbência

Área

Magistratura

Procuradorias

Destaque

O terceiro que ingressa no processo apenas na fase recursal e tem seu recurso não conhecido está sujeito à condenação em honorários recursais, desde que preenchidos os requisitos do art. 85, § 11, do C.

REsp 1.888.521-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 1º/4/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 85, § 11, do C determina a majoração dos honorários em grau recursal, mesmo em caso de não conhecimento do recurso.

???? O recurso do terceiro prejudicado submete-se às mesmas consequências dos demais sujeitos recursais, inclusive quanto à sucumbência.

???? O ingresso tardio no processo não afasta os efeitos da preclusão nem a aplicação das regras sobre ônus recursal.

???? O terceiro assume o processo no estado em que se encontra e deve observar os encargos já fixados.

???? A condenação é válida se a sentença de origem já tiver fixado honorários de sucumbência.

Discussão e Tese

???? O caso discutiu se terceiro que interpõe recurso não conhecido pode ser condenado em honorários recursais, mesmo sendo sua primeira manifestação no processo.

⚖️ Para o STJ:

• O terceiro recorrente se sujeita a todos os efeitos processuais, inclusive aos ônus decorrentes da sucumbência.

• A atuação voluntária em sede recursal não o isenta da aplicação do art. 85, § 11, do C.

• A lógica do sistema processual é de que quem recorre assume o risco da majoração de honorários se não tiver sucesso.

Como será Cobrado em Prova

???? Mesmo que o recurso interposto por terceiro não seja conhecido, é cabível a fixação de honorários recursais, desde que já tenham sido fixados honorários na sentença.

✅ Correto. A jurisprudência exige apenas os requisitos do art. 85, § 11, C para a majoração.

???? O terceiro que ingressa na fase recursal e tem seu recurso não conhecido está isento do pagamento de honorários recursais por não ter participado da fase de conhecimento.

❌ Errado. O STJ entende que, uma vez que recorre, o terceiro se submete às regras recursais, inclusive à majoração dos honorários.

Versão Esquematizada

???? Honorários Recursais e Terceiro Interessado
???? Art. 85, § 11, C – majoração no grau recursal ???? Requisitos: recurso não conhecido e honorários na sentença ???? Terceiro assume o processo no estado em que está ???? Ônus recursal incide sobre todos os recorrentes ???? Ingresso em fase recursal não afasta dever de sucumbência

Inteiro Teor

     Cinge-se a controvérsia em saber se terceiro interessado que ingressou na fase recursal e teve o recurso não conhecido pode ser condenado a pagar a verba honorária recursal.

     O art. 996 do Código de Processo Civil (C) determina que o recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público.

     De acordo com a doutrina, o recurso de terceiro prejudicado é ato processual voluntário, praticado por quem até aquele momento não era parte, mas que é idôneo a ensejar a reforma, a invalidação ou a integração da decisão judicial impugnada. Nesse sentido, tal recurso segue a aplicação da regra de o assistente receber o processo no estágio em que se encontra, nos termos do parágrafo único do art. 119 do C.

     Assim, ainda conforme a doutrina, embora não exista preclusão temporal para o ingresso do terceiro, a partir do momento em que ele é itido no processo, a todas as preclusões já operadas. Por conseguinte, ite também os resultados de todos os atos realizados antes de seu ingresso.

     Ao livremente optar por intervir no processo e recorrer, o terceiro interessado está ciente dos termos e determinações da decisão recorrida. Não pode, portanto, agir contraditoriamente ao assumir a decisão para pleitear benefícios com a sua reforma, mas negá-la para eximir-se do pagamento de honorários recursais, mesmo que sua primeira manifestação no processo seja em sede recursal.

     Logo, ao exercer o direito de recorrer, a consequência lógica é que o terceiro prejudicado também tenha o dever de arcar com o pagamento dos honorários recursais.

     Por fim, é pacífico o entendimento do STJ no sentido de que, na forma do art. 85, § 11, do C, a majoração da verba honorária deve ocorrer quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente: a) decisão recorrida publicada a partir de 18/3/2016, quando entrou em vigor o novo Código de Processo Civil; b) recurso do qual não se conheceu integralmente ou a que se negou provimento, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e c) condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que interposto o recurso (REsp n. 1.865.553/PR, Corte Especial, julgado em 9/11/2023, DJe de 21/12/2023; AgInt nos EREsp n. 1.539.725/DF, Segunda Seção, julgado em 9/8/2017, DJe de 19/10/2017).

     Nesses termos, para haver honorários recursais, deve haver condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que interposto o recurso, não importando em face de quem a decisão primeva fixou os honorários.

     Portanto, se a sentença fixou honorários advocatícios e, após isso, o terceiro prejudicado ingressa na lide para recorrer, ainda que seu recurso não seja conhecido, ele deve arcar com o pagamento dos honorários recursais, pois cumpridos todos os requisitos para que lhe seja imputado este dever, nos termos do art. 85, § 11, do C.

7.        Cobrança de taxa por associação de moradores em condomínio de fato

Indexador

Disciplina: Direito Civil

Capítulo: Condomínio

Área

Magistratura

Defensoria Pública

Destaque

É indevida a cobrança de taxas de manutenção por associação de moradores contra edifício que não aderiu formalmente à entidade, ainda que tenha feito contribuições voluntárias no ado.

AgInt no AgInt no AREsp 1.060.252-RJ, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/2/2025, DJEN 17/3/2025.

Conteúdo-Base

???? O Tema 882/STJ fixa que as taxas de manutenção criadas por associações não obrigam os não associados ou não anuentes.

???? O STF, no Tema 492, também reafirma a inconstitucionalidade da cobrança compulsória sem previsão legal específica e adesão formal até o advento da Lei n. 13.465/17, ou de anterior lei municipal.

???? Condomínios de fato em vias públicas não se equiparam a loteamentos fechados com regramento formal.

???? A contribuição voluntária, ainda que reiterada, não gera vínculo jurídico permanente.

???? A ausência de ato de associação afasta a obrigatoriedade de pagamento futuro de mensalidades.

Discussão e Tese

???? A controvérsia envolveu a possibilidade de cobrança de taxas de manutenção de edifício que, embora tenha contribuído por anos, não se associou formalmente à entidade de moradores.

⚖️ Para o STJ:

• O simples pagamento pretérito não implica adesão nem gera obrigação jurídica futura.

• A formalidade de associação é indispensável para a constituição do dever de contribuir.

• A liberdade de associação veda a vinculação compulsória sem anuência expressa.

Como será Cobrado em Prova

???? Edifício que realiza pagamentos voluntários por longo período pode ser considerado associado de fato e compelido ao pagamento de mensalidades futuras.

❌ Errado. O STJ afirma que a contribuição voluntária não supre a ausência de vínculo formal.

???? A cobrança de taxas por associação de moradores somente é válida se houver adesão formal ou previsão legal específica.

✅ Correto. Tanto o STF quanto o STJ exigem base legal ou manifestação expressa de vontade para gerar obrigação.

Versão Esquematizada

???? Taxas de Associação em Condomínio de Fato
???? Tema 882/STJ e Tema 492/STF ???? Vedada cobrança sem adesão formal ???? Contribuição voluntária não gera obrigação futura ???? Vias públicas não permitem restrição equiparada a loteamentos fechados ???? Liberdade de associação como fundamento constitucional

Inteiro Teor

     Cinge-se a controvérsia acerca da cobrança de taxa de manutenção criada por associação de moradores em condomínio de fato, estabelecido em vias públicas, contra edifício não associado formalmente.

     Inicialmente, é válido ressaltar entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram” (Tema 882/STJ).

     Nessa mesma linha, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 695.911-SP, em regime de repercussão geral, firmou a seguinte tese: “é inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei n. 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de o controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a as de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis” (Tema n. 492/STF).

     Ressalta-se que há entendimento firmado pela Quarta Turma do STJ no REsp 1.998.336-MG em que se afastou a aplicação do Tema 882/STJ à hipótese de loteamento fechado. Todavia, o caso em questão não trata de loteamento fechado, mas de condomínio de fato, estabelecido por edifícios de determinadas ruas de um bairro que impam o fechamento e/ou a restrição de o a vias públicas.

     Note-se que, em se tratando de condomínio de fato, diante da jurisprudência do STJ e do STF, não há dúvidas de que a cobrança promovida pela associação não merece prosperar.

     Cabe ainda destacar que, em caso de condomínio de fato estabelecido por moradores de bairros residenciais abertos que impõe o fechamento e/ou a restrição de o a vias públicas, a circunstância de terem sido feitas contribuições voluntárias por um dos edifícios da região, ao longo de vários anos, não configura adesão formal à associação de moradores, nem autoriza cobrança futura de mensalidades. Embora contribuições voluntariamente pagas ao longo de vários anos indiquem concordância e proveito com as atividades da associação, não configuram associação formal.

     Ademais, mesmo para aqueles, no ado, associados, não há dever jurídico de permanecer associado. Assim, não havendo ato formal de associação – mas mero pagamento espontâneo em anos pretéritos – a circunstância de haver cessado o pagamento, por si só, evidencia a inexistência atual de associação. Não haveria como exigir ato formal para desfazer ato que formalmente não existiu.

8.        Fornecimento de peças de reposição e inaplicabilidade do prazo de 30 dias do CDC

Indexador

Disciplina: Direito do Consumidor

Capítulo: Responsabilidade pelo Fornecimento de Produtos

Área

Magistratura

Defensoria Pública

Destaque

É indevida a aplicação por analogia do prazo de 30 dias do art. 18, § 1º, do CDC à obrigação de fornecimento de peças de reposição, prevista no art. 32 do mesmo diploma legal.

REsp 1.604.270-DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 1º/4/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 18 do CDC trata da responsabilidade pelo vício do produto, com prazo de 30 dias para reparação.

???? O art. 32 do CDC impõe o dever de manter peças de reposição, mas sem fixar prazo específico.

???? A analogia entre os dispositivos não é válida, pois se referem a obrigações distintas.

???? O silêncio legislativo quanto ao prazo no art. 32 reflete a complexidade das situações abrangidas.

???? A fixação de prazo deve ocorrer caso a caso, pelo juízo competente.

Discussão e Tese

???? A controvérsia tratou da possibilidade de aplicar o prazo de 30 dias do art. 18, § 1º, à obrigação de fornecimento de peças de reposição.

⚖️ Para o STJ:

• O prazo do art. 18 destina-se à solução de vícios do produto, não ao fornecimento de componentes.

• O art. 32 não estabelece prazo porque contempla variabilidade de situações concretas.

• A analogia criaria obrigação abstrata sem respaldo legislativo.

Como será Cobrado em Prova

???? Diante da ausência de prazo legal no CDC, o prazo para fornecimento de peças de reposição deve ser fixado conforme o caso concreto.

✅ Correto. A jurisprudência reconhece a necessidade de avaliação judicial caso a caso, sem prazo legal pré-fixado.

???? O prazo de 30 dias para reparo previsto no art. 18 do CDC aplica-se também ao fornecimento de peças de reposição, por analogia.

❌ Errado. O STJ afirma que são obrigações distintas e não ite analogia entre os dispositivos.

Versão Esquematizada

???? Fornecimento de Peças de Reposição
???? Art. 32 do CDC – obrigação sem prazo definido ???? Art. 18, § 1º – trata de vício, não de reposição ???? Inaplicabilidade por analogia ???? Prazo deve ser fixado conforme o caso ???? Complexidade e variabilidade justificam o silêncio legislativo

Inteiro Teor

          Trata-se de controvérsia na qual se debate a possibilidade de aplicação do prazo de 30 dias previsto no art. 18, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, por analogia, à hipótese do art. 32 do mesmo diploma legal.

     O art. 18, § 1º, do CDC retrata alternativas ao consumidor na hipótese em que o fornecedor do produto não soluciona o vício dentro do prazo de 30 dias. Conforme a doutrina, trata-se de prazo atrelado à responsabilidade do fornecedor na solução de vício de produto, ou seja, de vício adstrito aos limites do bem de consumo, sem outras repercussões (prejuízos intrínsecos), o que diferencia do fato ou defeito do produto, cuja consequência lógica está atrelada aos prejuízos extrínsecos sofridos pelo consumidor, gerando consequências relacionadas à indenização moral, material ou por danos estéticos.

     Portanto, o mencionado prazo de 30 dias não está relacionado à realização da obrigação propriamente dita, mas sim ao interstício necessário para que surja para o consumidor o direito potestativo de exigir, segundo sua conveniência, alguma das providências previstas nos incisos do § 1º do art. 18 do CDC.

     Não pode, assim, um prazo previsto para uma situação específica e de natureza distinta ser utilizado, em interpretação analógica, como parâmetro para criação de uma obrigação, cuja eficácia terá efeito erga omnes em decorrência da utilização da ação civil pública no caso concreto.

     O silêncio do art. 32 do CDC a respeito do prazo para a oferta de componentes e peças de reposição é inerente à complexidade de variedade de situações abarcadas pelo dispositivo.

     Assim, a redação do art. 32 do CDC reflete o silêncio eloquente do legislador, que, reconhecendo a situação fática regulada pelo dispositivo, fez verdadeira opção legislativa em não prever o prazo no texto normativo para que situações díspares não ficassem engessadas pelo preceito legal.

     Dessa forma, não parece razoável a extensão do prazo de 30 dias previsto no art. 18, § 1º, do CDC às situações concretas abarcadas pelo art. 32 do mesmo diploma legal.

     Ademais, a integração jurídica a ser promovida no caso concreto reverbera no reconhecimento de que o silêncio do art. 32 do Código de Defesa do Consumidor nada mais é do que o reflexo da intenção legislativa ante as inúmeras variáveis que possam ser abarcadas pelo referido dispositivo.

     Registre-se que não se está afastando, de forma irrestrita, a possibilidade de fixação de prazo razoável a depender da situação concreta, o que deve ficar a cargo do juízo competente quando do cumprimento da obrigação no âmbito de incidência da norma. É dizer, em cada ação individual de execução a ser proposta a partir da condenação na ação civil pública. Ou, de modo mais abrangente, com a eventual provocação do órgão legislativo competente.

     Daí a impossibilidade de se criar uma regra abstrata e irrestrita para toda e qualquer situação regulada pelo mencionado art. 32 do CDC, o qual exige a análise CONCRETA a respeito da necessidade perseguida pelo consumidor.

9.        Prevaricação exige dolo específico: desídia e comodismo não configuram o crime

Indexador

Disciplina: Direito Penal

Capítulo: Crimes contra a istração Pública

Área

Magistratura

Ministério Público

Carreiras Policiais

Destaque

Para a configuração do crime de prevaricação é indispensável o dolo específico de satisfazer interesse ou sentimento pessoal; meras condutas negligentes ou desidiosas não caracterizam o tipo penal.

AgRg no AREsp 2.693.820-SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 18/3/2025, DJEN 26/3/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 319 do Código Penal exige que o agente retarde ou deixe de praticar ato de ofício por interesse ou sentimento pessoal.

???? A jurisprudência do STJ é firme ao exigir a demonstração de propósito pessoal específico para configurar o crime.

???? A simples omissão funcional, por desídia ou comodismo, não satisfaz o elemento subjetivo do tipo.

???? A prevaricação é crime doloso com elemento subjetivo específico.

???? A ausência de prova objetiva da intenção pessoal afasta a tipicidade penal.

Discussão e Tese

???? O debate versou sobre a condenação de delegados por inércia istrativa e omissão em atos de ofício, sem demonstração de vantagem ou motivação pessoal.

⚖️ Para o STJ:

• A prevaricação não se confunde com a simples má gestão ou negligência istrativa.

• O dolo específico deve estar comprovado de forma objetiva e concreta.

• Não basta a demonstração de falhas operacionais para caracterizar o tipo penal.

Como será Cobrado em Prova

???? A prevaricação se configura sempre que o agente público deixa de praticar ato de ofício, independentemente do motivo.

❌ Errado. O STJ exige o dolo específico de satisfazer interesse ou sentimento pessoal para configurar o crime.

???? A ausência de prova concreta de interesse pessoal do agente na omissão funcional impede sua condenação por prevaricação.

✅ Correto. A jurisprudência exige demonstração objetiva do elemento subjetivo especial do tipo.

Versão Esquematizada

???? Prevaricação – Art. 319 do Código Penal
???? Dolo específico: satisfazer interesse pessoal ???? Desídia e comodismo não bastam ???? Necessária prova objetiva do propósito pessoal ???? Inércia istrativa ≠ crime sem dolo específico ???? Conduta atípica se ausente elemento subjetivo especial

Inteiro Teor

     O crime de prevaricação, previsto no art. 319 do Código Penal, exige para sua configuração o dolo específico de “satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, não sendo suficiente a mera negligência, comodismo ou descompromisso. É imprescindível que o agente se abstenha de praticar ato de ofício “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal” de maneira objetiva e concreta.

     No caso analisado, o Tribunal de origem condenou os réus, delegados de polícia, por não adotarem providências necessárias para a apuração de crimes, não incinerarem entorpecentes e não destinarem adequadamente armas e munições, além de omissões em boletins de ocorrência.

     Dessa forma, nota-se que a narrativa aponta para uma conduta pautada no comodismo e descompromisso, situações que, embora caracterizem desídia, não evidenciam a satisfação de um interesse pessoal específico ou um objetivo concreto de vantagem pessoal ou favorecimento indevido.

     A ausência de provas objetivas e concretas de que o réu agiu com o propósito de satisfazer interesse pessoal impede a manutenção da condenação, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça.

10.         Tráfico de drogas sem apreensão de entorpecentes: ausência de materialidade

Indexador

Disciplina: Direito Penal / Direito Processual Penal

Capítulo: Prova e Materialidade do Delito

Área

Magistratura

MP

Defensoria Pública

Carreiras Policiais

Destaque

É ilegal a condenação por tráfico de drogas fundada apenas em prints de redes sociais e mensagens eletrônicas, sem apreensão de substância entorpecente que comprove a materialidade do crime.

AgRg no HC 977.266-RN, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 20/3/2025, DJEN 26/3/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 33 da Lei 11.343/2006 exige demonstração da materialidade delitiva por apreensão da substância entorpecente.

???? A jurisprudência do STJ entende que sem apreensão da droga, a materialidade do tráfico não pode ser presumida.

???? Prints de redes sociais, áudios e mensagens eletrônicas são indícios, mas não substituem a prova material.

???? A confissão ou menções à traficância devem ser acompanhadas de apreensão ou perícia.

???? A condenação sem droga apreendida viola o devido processo legal e o princípio da presunção de inocência.

Discussão e Tese

???? O caso envolveu a condenação por tráfico baseada em mensagens de redes sociais e anotações, sem qualquer apreensão de entorpecentes.

⚖️ Para o STJ:

• A prova da materialidade é indispensável à validade da condenação.

• A ausência de substância entorpecente inviabiliza o reconhecimento do crime.

• Indícios isolados não suprem a necessidade de elemento material concreto.

Como será Cobrado em Prova

???? A prova da materialidade do tráfico de drogas pode ser suprida por mensagens eletrônicas e confissão, mesmo sem apreensão do entorpecente.

❌ Errado. O STJ exige a apreensão da droga como condição para configuração da materialidade.

???? A ausência de apreensão da substância entorpecente impede a condenação por tráfico de drogas, mesmo diante de indícios em redes sociais.

✅ Correto. A jurisprudência do STJ exige prova material concreta para validar a condenação.

Versão Esquematizada

???? Materialidade no Crime de Tráfico
???? Lei 11.343/2006, art. 33 ???? Apreensão da droga é indispensável ???? Indícios digitais não substituem prova material ???? Prova idônea exige substância + perícia ???? STJ: condenação sem droga é ilegal

Inteiro Teor

     A condenação pelo crime de tráfico de drogas exige a demonstração da materialidade delitiva por meio de provas idôneas, sendo imprescindível a apreensão de substância entorpecente ou outros elementos concretos que demonstrem a traficância.

     No caso, a condenação foi fundamentada essencialmente em prints de redes sociais e mensagens eletrônicas, sem a efetiva apreensão de drogas, o que contraria a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça.

     Não obstante a farta investigação que detectou a propriedade de perfis em redes sociais nos quais publicava venda de entorpecentes por parte do acusado, fato por ele confessado; da apreensão de caderno com anotações de tráfico do qual consta o seu nome, além do envio de áudio em um grupo do qual participava no whatsapp, pedindo para que “alguém comprasse suas drogas para deixá-lo forte”; não houve de fato apreensão de entorpecentes, impondo-se a absolvição do agravado por tal delito.

     Portanto, diante da inexistência de prova material apta a comprovar a traficância, requisito essencial para a comprovação da materialidade do crime de tráfico de drogas, mostra-se necessária a absolvição do acusado, em conformidade com o entendimento desta Corte.

11.      Violência doméstica: autonomia entre os crimes de violação de domicílio e lesão corporal

Indexador

Disciplina: Direito Penal

Capítulo: Violência Doméstica

Área

Magistratura

Ministério Público

Defensoria Pública

Carreiras Policiais

Destaque

Não se aplica o princípio da consunção entre os crimes de violação de domicílio e lesão corporal praticados em contexto de violência doméstica, pois tutelam bens jurídicos distintos e configuram infrações autônomas.

Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Otávio de Almeida Toledo (Des. convocado do TJSP), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 12/3/2025, DJEN 20/3/2025.

Conteúdo-Base

???? A consunção pressupõe relação de meio e fim entre os delitos, com absorção do crime-meio pelo crime-fim (Súmula 17/STJ).

???? O art. 150, § 1º, do e os arts. 5º e 7º da Lei Maria da Penha protegem bens jurídicos diversos: privacidade e integridade física.

???? A violação de domicílio protege a inviolabilidade da residência; a lesão corporal, a integridade física da mulher.

???? O reconhecimento da autonomia entre os crimes assegura resposta penal proporcional à complexidade da violência de gênero.

???? A prevalência do microssistema da Lei 11.340/2006 reforça a cumulatividade punitiva e afasta a consunção.

Discussão e Tese

???? O caso tratou de agente que invadiu a casa da companheira e a agrediu fisicamente em seguida, tendo sido condenado pelos dois delitos.

⚖️ Para o STJ:

• Os crimes possuem objetividades jurídicas distintas e não configuram progressão criminosa.

• Aplicar a consunção nesses casos enfraqueceria a proteção penal da vítima e violaria a dogmática da vitimologia.

• A resposta penal deve refletir a complexidade das agressões no contexto doméstico.

Como será Cobrado em Prova

???? Os crimes de violação de domicílio e lesão corporal contra mulher no ambiente doméstico praticados no mesmo contexto não podem ser punidos cumulativamente, sob pena de bis in idem.

❌ Errado. A jurisprudência reconhece a necessidade de resposta penal separada para proteger bens jurídicos distintos.

???? No contexto da violência doméstica, o crime de lesão corporal absorve o de violação de domicílio, em razão da unidade de desígnios do agente.

❌ Errado. O STJ afastou a consunção por inexistência de relação de meio e fim entre os delitos.

Versão Esquematizada

???? Violência Doméstica e Consunção
???? Súmula 17/STJ – consunção exige crime-meio e crime-fim ???? Art. 150, § 1º, – violação de domicílio ???? Art. 129, § 9º, – lesão corporal em contexto doméstico ???? Microssistema da Lei Maria da Penha prevalece ???? Crimes autônomos e cumuláveis na violência de gênero

Inteiro Teor

     A questão em discussão consiste em saber se o princípio da consunção seria aplicável entre os crimes de violação de domicílio e lesão corporal, quando praticados em contexto de violência doméstica e/ou familiar.

     Inicialmente, não se olvida que a pacífica jurisprudência trilhada pelo Superior Tribunal de Justiça ite que um crime de maior gravidade, assim considerado pela pena abstratamente cominada, pode ser absorvido, por força do princípio da consunção, por um crime menos grave, quando, repita-se, utilizado como mero instrumento para consecução de um objetivo final único (AgRg no AREsp n. 100.322/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 25/2/2014, DJe de 7/3/2014).

     Esta, por certo, constitui a linha de raciocínio (ordinária) sedimentada no enunciado da Súmula n. 17/STJ, ao advertir ser possível que o crime-meio, quando exaurido no crime-fim, sem mais potencionalidade lesiva, seja por este absorvido.

     Todavia, por tutelarem objetividades jurídicas distintas, não se aplica o princípio da consunção (como metanorma absolutória, fruto de política criminal) na hipótese em que o crime de “invasão de domicílio” (destinado a salvaguardar a privacidade, o sossego e a tranquilidade do indivíduo) é seguido ou até mesmo precedido – de forma “autônoma” – do crime de lesões corporais (ou outro correlato), no deletério contexto permeado pela violência de gênero (misógina) doméstica ou familiar, com intransponível topografia normativa albergada pelo microssistema de proteção estatuído nos arts. 5º e 7º, ambos Lei n. 11.340/2006 e sem qualquer correspondência à situação de progressão criminosa.

     Isso porque o “mandado de criminalização” estatuído pelo legislador pátrio, no preceito secundário do art. 150, § 1º, do Código Penal, determina, de forma cogente e indene de dúvidas, que se o crime é cometido com o emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas, ao agente será cominada a pena de detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência.

     No caso, conforme ressaltado pelo Tribunal de origem, o agente prevalecendo-se das relações domésticas e de afeto, e com opressão de gênero e violência, adentrou na residência de sua namorada contra a vontade da ofendida, ao arrombar a porta de entrada com chutes. Na mesma ocasião, motivado por ciúmes e embriagado, ofendeu a integridade corporal de sua namorada pegando-a pelo pescoço e causando-lhe as lesões corporais descritas no exame pericial.

     Verifica-se, portanto, que o agente entrou na residência da ofendida contra o consentimento dela, porquanto estava inconformado com a suposta presença de outro homem no local. Agindo assim, atentou contra a liberdade da vítima, consubstanciada na inviolabilidade domiciliar, regra que visa à proteção de sua intimidade e privacidade, fatores independentes e alheios ao delito de lesão corporal posteriormente praticado.

     Dessa forma, como o crime de violação de domicílio não constituiu meio indispensável de preparação ou execução da infração penal de lesão corporal, inaplicável o princípio da consunção.

     Nesse sentido, já decidiu a Quinta Turma do STJ que “É inviável o reconhecimento da consunção entre o delito de violação de domicílio e o de lesão corporal no âmbito doméstico quando um não constitui meio para a execução do outro, mas evidentes infrações penais autônomas, que tutelam bens jurídicos distintos (AgRg no REsp n. 1.902.294/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/3/2021, DJe de 8/3/2021).

     Com efeito, entender em sentido contrário representaria proteção estatal insuficiente à objetividade jurídica disposta nos arts. 129, § 9º, e 150, § 1º, ambos do Código Penal, associados às disposições (cogentes) estatuídas nos arts. 5º e 7º, ambos da Lei n. 11.340/2006 (proporcionalidade pelo viés negativo), insustentável à luz do subjacente e equânime garantismo “integral” (não hiperbólico monocular), integrado pela evolutiva e necessária dogmática da “vitimologia” (primária e secundária), encampada na Declaração dos Princípios Básicos de Justiça relativos às “Vítimas” da Criminalidade (Resolução da ONU n. 40/34, de 29 de novembro de 1985).

12.     Habeas corpus para revisão de cláusulas do acordo de não persecução penal

Indexador

Disciplina: Direito Processual Penal

Capítulo: ANPP

Área

Magistratura

Ministério Público

Defensoria Pública

Destaque

Não cabe habeas corpus para discutir cláusulas do acordo de não persecução penal (ANPP); eventual revisão deve ser solicitada ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do art. 28-A, § 14, do P.

RHC 184.507-MT, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 1º/4/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 28-A do P regula o ANPP como negócio jurídico processual firmado entre MP, investigado e defesa técnica.

???? O § 14 do art. 28-A prevê a remessa da proposta ao órgão superior do MP em caso de recusa ou controvérsia.

???? A reparação de danos é cláusula expressamente prevista como condição do acordo.

???? O habeas corpus não é instrumento adequado para questionar cláusulas do ANPP.

???? A via própria é a provocação do Procurador-Geral para eventual revisão da proposta.

Discussão e Tese

???? O caso envolveu impugnação, via habeas corpus, à cláusula de indenização por danos morais prevista no ANPP, com alegações de hipossuficiência e litígio cível paralelo.

⚖️ Para o STJ:

• A discordância com os termos do ANPP deve ser tratada no âmbito interno do MP.

• A existência de ação cível não impede a estipulação de cláusulas indenizatórias no acordo penal.

• A preclusão operou-se porque a defesa não requereu revisão nos termos legais.

Como será Cobrado em Prova

???? O habeas corpus não é meio processual adequado para revisar cláusulas de valor indenizatório previstas no acordo de não persecução penal.

✅ Correto. O STJ entende que esse controle deve ocorrer por meio de remessa ao órgão superior do MP, conforme o art. 28-A, § 14, P.

???? A cláusula de reparação mínima de dano no ANPP pode coexistir com demandas cíveis já em curso, por se tratar de esferas jurídicas distintas.

✅ Correto. O STJ reconhece a independência entre os âmbitos penal e c

Versão Esquematizada

???? ANPP e Controle de Cláusulas
???? Art. 28-A, § 14, P – revisão pelo órgão superior do MP ???? Habeas corpus: via inadequada para rediscutir cláusulas ???? Cláusula de reparação não depende de ação cível ???? Preclusão por ausência de provocação formal ???? ANPP como negócio jurídico pré-processual

Inteiro Teor

     A questão em discussão consiste em saber se a proposta de acordo de não persecução penal, que inclui a reparação de danos morais, pode ser considerada ilegal ou desproporcional, especialmente diante da alegada incapacidade financeira do recorrente e da existência de ação cível em curso.

     O acordo de não persecução penal (ANPP), previsto no art. 28-A do Código de Processo Penal (P), consiste em negócio jurídico-processual entre investigado, seu defensor e o Ministério Público. Dentro desse contexto, a reparação do dano causado à vítima é uma das condições expressamente previstas no inciso I do referido dispositivo legal, que assim estabelece: reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo.

     No caso, o recorrente foi denunciado pela prática de crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor. Durante a audiência de instrução, o Ministério Público ofereceu proposta de ANPP ao recorrente, incluindo como condição a reparação mínima de danos morais em favor da família da vítima falecida, no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), que foi recusado pela defesa, alegando incapacidade financeira para cumprir a condição de reparação de danos e existência de ação cível em curso.

     Em sede de habeas corpus, a defesa insiste na necessidade de reformulação do ANPP, sob o argumento de que a proposta de pagamento de indenização por dano moral apresentada pelo Ministério Público é desproporcional. Afirma já existir ação de reparação cível em curso, bem como medida liminar fixando alimentos no valor de 1/4 do salário mínimo em favor do filho da vítima, considerando assim que a manutenção da proposta nos moldes formulados implicaria duplicidade de pleitos indenizatórios.

     Ora, ao não aceitar o ANPP, a defesa técnica poderia ter requerido ao Juízo de primeiro grau a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do art. 28-A, § 14, do P, para revisão da proposta de acordo, o que não ocorreu.

     Conforme salientado no acórdão do Tribunal de origem, houve mera recusa da proposta pela defesa, sem que tenha sido formulado pedido específico para remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça, operando-se, portanto, a preclusão.

     É válido observar que o instrumento adequado para questionar as condições da proposta de ANPP seria a remessa ao órgão superior do Ministério Público, conforme previsto no § 14 do art. 28-A do P, e não o habeas corpus, como pretendido pelo recorrente. Ademais, destaca-se que a existência de ação cível em curso não impede a estipulação da reparação de danos como condição do ANPP, tratando-se de esferas jurídicas distintas.

     Quanto à alegada hipossuficiência financeira do recorrente, esta questão, por si só, não torna ilegal a proposta formulada pelo Ministério Público. O próprio inciso I do art. 28-A prevê a exceção “na impossibilidade de fazê-lo”, que poderia ser objeto de análise pelo órgão superior ministerial, caso fosse provocado na forma adequada.

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Veja os comentários
  • Nenhum comentário enviado.